Politicamente sou apenas meio burro, de vez em quando aprendo alguma coisa, mesmo que empiricamente. Entre as poucas coisas que aprendi foi que, quanto mais próximo do cume da pirâmide eleitoral o sujeito se encontra, menos fala espontaneamente, torna-se porta voz de seus financiadores de campanha, dos seus assessores mais poderosos, dos cardeais do seu partido e, mais enfiado na moita do que calango tímido, do seu marqueteiro.
A Dilma, a bola da vez em quem devo descarregar minha espingarda de sal, daquelas que não matam, e nem prego isso, mas ardem um bocado quando atingem a bunda, desde o início de seu mandato vem contrariando alguns discursos repetitivos de seu ancestral, o ex-graçasaDeus-presidente. Se não, vejamos: Não ficou com o megalômano Celso Amorim no Itamaraty, mesmo sob constante insistência de Lula, preferiu um ministro também sonhador vermelho, mas mais low-profile; depois de uma campanha em que o ex lançou o mote das privatizações tucanas como um malefício para o país, ela partiu para a privatização dos aeroportos – pelo menos a parte externa do negócio -, algo que nem o mais liberal dos tucanos havia desejado publicamente; mais recentemente, mesmo todo mundo sabendo que houve p dedo mindinho da mão direita de Lula na demissão de Palocci, ela, através de seus luas pardas, como Vaccarezza, Suplicy e a Globo News, fez questão de espalhar que ela havia decidido sozinha a troca da chefia da Casa Civil e que agora tomava de vez as rédeas do governo. É mentirinha, mas com auxílio da imprensa canina a mentirinha colou.
Dou-me a ousadia de discordar das análises de Reinaldo Azevedo, grande mestre da análise política crítica e oposicionista, ídolo de nove em cada grupo de oito opositores, segundo minhas pesquisas à guisa de Vox Populi. Prefiro ficar com o Nivaldo Cordeiro, com algumas discordâncias, que vê mais claramente o distanciamento entre a atual e o ex, propositadamente. Nivaldo vê Dilma distanciando-se, mas sem força de encarar Lula em sua volta em 2014, candidatura esta já lançada por idiotas (desculpem a grosseria, mas não encontro outro adjetivo mais propício), como Ciro Gomes, o eterno candidato a coisa nenhuma e continua ganhando nada. Nivaldo não vê qualquer petista capaz de fazer sombra a Lula e vencê-lo, já eu prefiro ficar com um pé atrás e de olho nas manobras do marqueteiro João da Couves que vem orientando Dilma e seu staff. Nivaldo parece esquecer que ninguém acreditava que ela se elegesse, nem mesmo ele cria, e até duvidava que o próprio Lula cresse. Chamaram-na de “poste” – eu também quase chamei -, louvaram sua incompetência administrativa, suas mentiras contumazes, sua inexperiência eleitoral... E deu no que deu.
Uma outra coisa que aprendi é que o dono do cheque jamais perde uma eleição, a não ser que tenha pisado em muitos calos que poderiam ser amigos antes da eleição. Este pecado Dilma pode cometer, e espero que cometa, mas ela tem o cheque agora, dinheiro que pagamos durante cinco meses de trabalho, para ela comprar votos, amigos, base parlamentar, cabos eleitorais famosos como apresentadoras de televisão, pobres famintos – que ela e seu ex insistem em dizer que acabaram, mas continua fazendo campanha para acabá-los – e celebridades, sejam as mais duradouras, como Bono Aproveitador Vox, sejam as nescafé, que são efêmeras e já vem prontas da fábrica. O que lhe falta é o que o marqueteiro vem orientando-a a fazer: distanciar-se da sombra de Lula, de preferência contrariando-o de vez em quando e ela não tem perdido a oportunidade.
Aproveitando-se dos 80 anos de FHC ela escreveu a carta-homenagem onde afirma, do alto de seu troninho de presidente, coisas que Lula sempre negou admitir, sequer para amigos em boteco (se bem que está longe o tempo em que ele freqüentava botecos menos chiques que os Fasano da vida). São trechos da dita carta:
“O acadêmico inovador, o político habilidoso, o ministro-arquiteto de um plano duradouro de saída da hiperinflação e o presidente que contribuiu decisivamente para a consolidação da estabilidade econômica.”(...)”O espírito do jovem que lutou pelos seus ideais, que perduram até os dias de hoje"(...)"Esse espírito, no homem público, traduziu-se na crença do diálogo como força motriz da política e foi essencial para a consolidação da democracia brasileira em seus oito anos de mandato"(...)"Não escondo que nos últimos anos tivemos e mantemos opiniões diferentes, mas, justamente por isso, maior é minha admiração por sua abertura ao confronto franco e respeitoso de ideias. Querido presidente (grifo meu), meus parabéns e um afetuoso abraço.
Se é bom ou ruim, nem preciso dizer, quem me conhece sabe que tenho asco ao PT e qualquer coisa que venha dele, mas para mim é bem claro que ela, com apenas seis meses de mandato, está sempre dando uma afastadinha em Lula. Ele e o João das Couves devem pensar “já foi construída do nada uma vez, quem sabe não dá outra zebra e puxa o tapete do coronel?”. E só por ela poder passar-lhe a rasteira, e espero que sem reeleger-se, porque aí seria demais para meu fígado, já é uma boa coisa.
©Marcos Pontes