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domingo, julho 02, 2006

Casamento caipira - Clóvis Graciano

Conversa na Calçada


É verdade, sim, sinhô, seu moço. Eu fui muito ruacêro na minha juventude, o sinhô nem magina. Mai sempre fui dereito, sim sinhô. Era eu e meu cumpadi Secundino os mais ruacêro daqui. Todo dia nóis fazia arte cum povo daqui, só por arrelia, pá dexá o povo neuvoso.

O povo ia pá quermesse pá mó de dá dinhêro pu pade, nóis ia pá mexê cum as moça, mai num era quarqué moça, não, só cum as que tinha namorado, só pá mó de vê o cabra ficá sortando fogo pelas venta. Daí, quando ele vinha tomá sastifação, nóis abraçava ele, dizia que era brincadêra e terminava ficano amigo, inté tomava umas pinga junto pá comemorá.

O Secundino casô premero que eu. Ficô engraçado com a cumade Eleutéra e quetô. Eu fiquei sem o amigo das pândega, mai continuamo amigo. Pu sinhô vê como eu sô dereito e num gosto de malaquiage, o cumpade Secundino mandô a fia mais véia dele instudá na capitá. Só que ela num instudava nem nada, ela virô rapariga, meu fio Quedim que discubriu. E meu cumpade Secundino todo babão da fia que tava fazeno iscola de dentista em Salvadô. Era dotôra Valdicéa pá cá, dotôra Valdicéa pá lá, inté que um dia encontrei o Secundino no Corrêo, ele ia mandá dinhêro pá ela comprá os negóço de dotôra lá dela. Todo mêis ele vendia uma vaquinha pá mó de mandá dinhêro pá fia rapariga lá dele. Eu sô dereito e num gosto de malaquiage. Contei pu Secundino que a fia dele num instudava pá dotôra nem nada, era rapariga de déis conto, lá isso era. Ele nunca mais mando dinhêro pá ela e nem inscreve mais carta. Num tô certo? Tô certo, sim. Se tô!

Isso dexô o Secundino véio. Ele tem o mesmo tanto de ano que eu, mai tá muito mais véio.

Eu num gosto de véio, num gosto, não. Véio tem umas mania besta. Pu exempro, o sinhô é meu fio? Não, o sinhô num é meu fio, num é mesmo. Num sei nem quem é sua mãe, como é que o sinhô é meu fio? Se bem que uns minino instudado me disse que os cientista inventaro um jeito de fazê fio sem fazê indecença com a muié. Um tal de bebê de vrido. Tem ôtro nome lá, mai só me alembro desse negóço de bebê de vrido. E minhas coisa é lá garrafa pá eu fazê bebê de vrido? Deus me deu minhas coisa pá mijá e fazê fio em muié, não em garrafa de vrido.

Apois intão, véio tem mania de chamá todo moço mais novo de "fio". O Secundino chama os moço tudo de "fio", "fia". Meus fios são o Quedim, a Maluza, o Zequeu, a Diocéa, a Varmira, o Zabuco, a Hélia e o Setembrino. Eu tenho um ôtro fio, mai num é bem meu fio. Tinha uns tempo que toda vêiz que eu quiria fazê indecença, minha muié Faliça inventava uns calô estranho. Num era calô nem nada, acho que ela tava ficano véia tomém e num quiria mais brincá, perdeu o gosto. Aí eu fui lá na casa das minina e cabei emprenhando a Saldiva, uma rapariga de lá. Diz ela que o fio é meu, o dotô tomém feiz um inzame de deneá e falô que é meu. Mai o menino é mai fio dela que meu. Fio de rapariga, o sinhô sabe. Hoje ele é vereadô. Fio de rapariga nunca fais nada dereito, taí o Quinzinho, virô político. Coisa de fio de rapariga. Num dá nada certo. Dá? Num dá.

A Faliça, adispois que a Saldiva imprenhô, remoçô. Passô os calô lá dela e hoje ela já gosta de fazê imoralidade de novo. O bão é que num pode mais imprenhá.

É bom tê fio, mai na nossa idade, magina tivesse um minino agora... Quando ele compretasse dez ano num ia mais tê pai pá brincá com ele, como é que eu ia jogá bola com ele, insiná ele a muntá no potro, insiná ele a caçá preá? Num pudia, pudia? Num pudia. Mió num tê mais fio, Deus sabe o que fais.

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