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quinta-feira, junho 19, 2008

ParedonEraRevolucionaria2

No último final de semana estive conversando com uma amiga que acabara de voltar de Cuba. Casada com um petista de primeira hora, ela, que conheci ainda garota alienada, mais preocupada com com a próxima micareta e com o cara que fisgaria à noite, deixou-se catequisar pelas convicções políticas do marido.

Tirando o viés político que nos separa, são duas pessoas muito queridas, com quem tive papos, cervejadas e curtições bem agradáveis. Não fique, portanto, a impressão que lhes tenho má impressão. Não sou tão sectário a ponto de evitar alguém por conta de suas ideologias.

Mas voltemos ao que interessa.

Essa amiga estava maravilhada com o que vira na ilha. Como turistas e filiados ao partido do amigo de Fiel, ficaram num grande hotel, daqueles que até o mês passado proibiam a entrada de cubanos. Enquanto ela discorria sobre a parte turística, o Mar do Caribe, a simpatia do povo, a culinária sui generis, estava tudo bem. Mas é inevitável se falar de política quando se conversa sobre Cuba.

E essa parte da conversa não foi muito longe. "Lá todo mundo é igual", falava ela, brilho nos olhos. Não me contive.

- Qual a vantagem de serem todos iguais na miséria?

- Quem disse que há miséria? Todos têm casa e comida, roupas e assistência médica.

- Casa onde chegam a morar três gerações da mesma família. Comida racionada e sem variedade. A única sorveteria de Havana tem filas nos domingos, único dia em que o povo se dá ao luxo de tomar sorvete.

- Sorvete? Marcos, isso é supérfluo!

- Supérfluo para nós que podemos nos dar ao luxo de escolher a marca, o sabor, o preço e a hora de tomar. Sem falar que temos centenas de outros doces para optar.

Não sei se propositadamente, ela não comentou o fato de avós, pais, filhos e agregados terem que dividir o mesmo teto minúsculo.

- Mas pode-se viver muito bem sem sorvete. E a saúde, referência mundial?

- Opa! Aí há um grande mito. A grande vantagem da medicina cubana é a medicina familiar, preventiva. Nisso eles realmente são referência.

- Aí que você se engana. Eles têm medicina de primeira linha.

- Não é bem assim... Em toda a ilha há um tomógrafo, um hospital de porte. Não existe indústria farmacêutica , depois do fim da União Soviética a importação de remédios ficou à míngua. Muitas são as ajudas humanitárias que evitam o colapso.

E por aí foi a discussão.

Volta e meia ela voltava ao velho mote de que todos são iguais. Eu também cheguei a acreditar nisso quando era um jovem idealista que se deixava emprenhar pelos ouvidos, que acreditava em tudo o que ouvia. Mesmo sendo filho e neto de militares e tendo dois irmãos do Exército, a ditadura não me agradava. Idealista, sim, alienado jamais.

Aliás, a simpatia por Cuba, Che e Fidel cresceru muito no Brasil justamente por terem sua imagem associada a uma utópica irmandade latino-americana, como ícones da resistência dos subjulgados ao império ianque. Na linha maniqueísta de raciocínio, na qual somos pródigos, ou se era a favor da ditadura, portanto fãs dos estadunidenses, ou se era comunista, fã dos revolucionários por tabela.

Nem demorei muito a perceber que as alternativas são muitas e me afastei definitivamente de qualquer uma das duas correntes. Cheguei à conclusão que ideologias pré-fabricadas são engondos enfiados goela a baixo dos que não têm muita capacidade ou vontade de questionar. Se estou certo? Provavelmente, não. Mas isso é outra história.

Essa questão da igualdade entre os cidadãos cubanos (se é que alguém que vive sob o julgo de um estado totalitário pode ser considerado cidadão) também é um mito. Assim como acontecia na União Soviética, na Alemanha Comunista, na China, na Albânia ou em qualquer outro país vermelho, em Cuba também existe uma casta privilegiada formada pelos membros dos primeiros escalões do governo e do partido. Para esses existem vilas privativas e, muito provavelmente, víveres e conforto sem a necessidade de entrar em filas quilométricas ou de cadernetas de controle dos gêneros adquiridos no mês.

Minha amiga é casada com funcionário da Caixa Econômica Federal, no Brasil uma casta superior, assim como os do Banco do Brasil, da Petrobrás e outros tantos órgãos federais. A princípio, nada contra. Seria ótimo que todos os trabalhadores brasileiros tivessem os salários, plano de saúde, plano de carreira, plano de previdência próprio, aposentadoria integral e todos os outros direitos trabalhistas, além de uma carga horária de seis horas diárias, trinta horas por semana que os bancários dos bancos oficiais têm. Além disso tudo, são praticamente intocáveis, ou alguém conhece um funcionário da CEF demitido por improdutividade ou outra falha que seria considerável grave em qualquer empresa privada? E para se ter tudo isso nem é necessário um terceiro grau.

Na sua pregação sobre a igualdade privada, rebati:

- Qual a vantagem de serem iguais na pobreza? Aliás, você gostaria de ser iguais a eles? Abriria mão de sua tv por assinatura, do carro do ano, da casa própria onde moram só você e seu marido, da moqueca de lagosta em Alcobaça num final de semana de tédio, das viagens ao exterior, de um passeio ao Rio só para assistir ao show do Chico Buarque para ter uma vida igual às das tuas duas empregadas domésticas?

Acabou-se a discussão. Ela fez um bico! Xingou a mim e à minha mãe e me deixou falando sozinho enquanto batia a porta ao sair.

Cada vez mais acho um primor a frase que mais explica a hipocrisia da classe média intelectualizada brasileira, proferida por Joãozinho Trinta: "Quem gosta de miséria é intelectual. Pobre gosta de luxo".

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Dicas: Leiam os blogs El Compañero e Cuba Humor.

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