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domingo, abril 13, 2008

A cólera que ficou - Parte III

Mais un desafio literário. A idéia foi da Adriana, que também começou a narrativa. O David fez a segunda parte . Aqui está a terceira parte e a Thayse deverá encerrar essa primeira rodada. Se vamos dar o conto encerrado depois da participação da paraibaninha, não tenho idéia. Quem quiser entender o enredo e se divertir, siga a seqüência; Adriana, David e eu, depois a Thayse.

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charles_bukowski

A fuga do escritório lhe dava um alívio, a quinta-feira ficou com cara de sábado, dia em que só a peãozada trabalha, não um executivo como ele. Ora, cacete, fizera faculdade, ,mestrado, MBA pra quê? Escorar a bunda numa cadeira acolchoada, rodeado por beócios e diretores ególatras? Uma ova!

Em casa passara pelos esculachos desmedidos da mulher, no escritório, esporros dos chefes, chefes, aliás, que deveriam ser subalternos. Que dane-se tudo isso. Agora era só decidir que rumo tomar. Voltar para o apartamento e encher a cara o resto do dia com a vodka, ou sair zanzando pela cidade e seu tráfego barulhento e caótico?

O que precisava mesmo era de um afago, os braços quentes de uma mulher, o consolo de palavras ou do sexo... Onde encontrar isso numa quinta-feira de manhã se ela não perdoara aquela única traiçãozinha?

Saiu à toa, paletó em uma das mãos, a garrafa de bebida na outra, um gole de vez em quando, enquanto observava sem qualquer interesse a turba humana que o cercava, sempre apressada, caras sisudas, todos com um lugar para onde ir, alguém os esperando, um sorriso e uma trepada no final do dia. Ele, agora solitário, sem perspectiva, a conta no banco castrada pela metade, a casa vazia, entregue às baratas e ao cheiro do mofo nas fatias de pizza espalhadas sobre a mesa.

Qual é? Que sentimentozinho de auto-piedade era esse que se apresentava agora? Isso também é muita bichice! Homem que é homem não fica se lamentando e nem bebe para esquecer, isso é apenas desculpa. O álcool é apenas um catalisador para nova organização de sua vida.

Enquanto zanzava se perguntando para onde ir, decidiu-se seguir em linha reta, quarteirão após quarteirão, talagada após talagada no líquido branco que descia o nível na garrafa e subia pelas veias até o cérebro.

Nessa caminhada sem rumo sente a vibração no bolso da calça. Atende ao celular sem qualquer bom humor, apenas pelo hábito de atender a qualquer chamado a qualquer hora.

- Onde o senhor está? A reunião já começou, precisamos de seus relatórios.

- Vá à merda! Enfia essa porcaria de empresa no rabo!

Antes de receber o anúncio da demissão sumária, desligou o aparelho e o atirou no meio do asfalto. Cacos para todos os lados e um silêncio absurdo no cérebro. Sentia que acabara de tirar o pescoço de sob a lâmina de sua guilhotina particular. Continuaria andando até mudar de idéia ou até que o álcool lhe desse uma solução para a vidinha sem graça, que dava-se conta agora, que vinha vivendo.

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