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quinta-feira, abril 10, 2008

Sem Compromisso

boate

 

Quinta-feira é o dia em que a casa ferve. Seus três ambientes superlotam.

No térreo o restaurante e suas mesas forradas de linho, decoração rica, garçons no mais nobre dos uniformes. As luzes indiretas dão um clima de romance muito bem aproveitado pelos comensais, casais das mais diversas formações. No lugar de cadeiras quadradas, poltronas em semicírculo, forradas de couro. Nos cantos vasos com plantas altas que encobrem das vistas curiosas os sofás confortáveis. Ambiente propício para os romances mais tórridos, mesmo que por apenas uma noite.

No segundo andar a boate. Os caçadores e candidatos a caça se aglomeram sob as luzes nervosas, o barulho de músicas ou apenas aglomerados de notas eletrônicas. Sem mesas, apenas alguns bancos altos próximo ao balcão e as camas separadas da pista de dança por cortinas translúcidas, daquelas que mostram as silhuetas dos casais entrelaçados sem permitir que sejam reconhecidos. A clientela é responsável pela excitação dela própria.

No terceiro piso, o restaurante íntimo. Músicas suaves, decoração oriental com biombos separando os boxes que admitiam até seis pessoas. Em cada boxe uma enorme mesa quadrada à altura dos joelhos de uma pessoa de estatura mediana. Ao seu redor, almofadas. Quem se internava naqueles boxes ia para comer, fosse o que fosse, do sashimi à carne crua. Naquele ambiente ajaponesado, a bebida mais consumida não era o saquê, mas energéticos e champagne.

O restaurante oriental era o ambiente preferido do garçom Adelino. Embora jovem e bem apessoado, Adelino não gostava de barulho, gente suada, e as luzes piscantes e coloridas o deixavam tonto. No restaurante, por ser mais caro e mais íntimo, as pessoas eram mais tranqüilas, o serviço menos acelerado e as gorjetas mais generosas.

Naquela quinta, casa lotada, a sala de espera pelos boxes estava grande. Na sala de espera, em sofás circulares, a clientela tomava seus drinques e se sociabilizava. Não raramente ali se formavam novos casais, um casal se desfazia e intercambiava-se com outras duplas. Liberado um boxe, os fregueses definiam se iam juntos ou algum cederia a vez para outro.

Duas e meia da manhã, apenas três pessoas aguardavam sua vez para a refeição. Há quem goste, e não são poucos, desse tipo de jantar. Um casal se beijava e uma mulher os acariciava, sem pudores, à vontade sob os olhares vidrados dos três garçons que se esforçavam para darem conta dos pedidos sem perderem muito da cena ardente.

Uma sineta toca e um dos garçons, passos apressados, já pensando no retorno nada discreto à sala de espera, some pelo corredor em penumbra proposital. Uma campainha toca e outro garçom dirige-se para a cozinha de onde sairá apressado carregando uma bandeja coberta por redoma de prata e um balde com gelo e uma garrafa de champagne.

Sozinho atrás do balcão, Adelino encabula-se, mas não consegue evitar os olhares para o trio cada vez mais ofegante. Seus olhos cruzaram-se rapidamente com os da mulher que velava os amassos do casal. Profissionalmente tímido, baixa o olhar, acidentalmente olha para sua calça estufada abaixo da fivela do cinto. Volta a olhar para o trio e recebe o olhar fixo da mulher.

Morena, sem pintura, sem jóias ou bijuterias, olhos grandes e pretos, ela descruza as pernas, deixando-as ligeiramente afastadas, permitindo que Adelino veja o fundo azul escuro de sua calcinha. Aquele convite mais explícito que se fosse de palavras não permitiu que ele desviasse novamente o olhar.

Ela afagava o cabelo do rapaz com a mão direita, enquanto a esquerda puxava ainda mais pra cima a saia curta mostrando as pernas douradas de sol e o que Adelino antes adivinhara: a calcinha pequena, apenas dois fios prendendo aquele triângulo minúsculo de lycra.

O primeiro garçom a ter saído, volta acompanhado por dois casais, entrega a pequena pasta para Adelino que confere a conta e o pagamento feito. Os quatro descabelados e sorridentes abrem a porta e desaparecem, mas ninguém percebeu. O garçom pede que o trio o acompanhe para o boxe livre. O casal levanta-se, mas a morena permanece onde está. Os dois olham rapidamente para ela, mas, pela direção dos olhos negros, percebem que o trio combinado se desfizera. Para os dois funcionários nada surpreendia mais. Somem na penumbra o garçom e o casal.

A morena faz um aceno chamando Adelino para sentar-se ao seu lado. Envergonhado com sua ereção, o garçom sai de trás do balcão com uma bandeja na mão. Envergonhado, sim, mas não o suficiente para recusar a tão incisivo convite.

Chegando à frente da moça, sem uma palavra, estica a mão livre. Ela lhe dá a sua. Com um leve puxão, ele a obriga a levantar-se. A leva para o fundo do corredor. Sabia que o último boxe estava sempre livre. Às vezes o patrão aparecia e queria jantar sossegadamente, mas nunca àquela hora. Nesses dias o boxe ficava livre para os garçons e suas eventualidades. Ela pegou uma pequena bolsinha que estava sobre o sofá e ele deixou a bandeja ali.

Já amanhecia quando o boxe abriu-se e os dois saíram. Ele sem gravata, camisa fora da calça, cabelos desgrenhados e marcas de unhas nas costas, no bolso uma calcinha azul. Ela tentando arrumar os cabelos, um sorriso de satisfação nos lábios.

- Nos vemos amanhã?, pergunta ele demonstrando implicitamente o prazer que sentira.

- Acho melhor não.

Abre a pequena bolsa, tira de dentro uma aliança, coloca-a no dedo anelar esquerdo, levantando-o para que Adelino compreenda a mensagem. Vira-se e dirige-se à porta deixando um rastro de perfume vencido e sexo.

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Há uma semana passei um dever de casa para a Thayse e para o David: escrever um conto cujo tema fosse um cara salvo do afogamento por uma boneca inflável. Hoje repetimos a dose, e o tema é uma transa fortuita, sem amor, a partir de um encontro de bar. Nenhum dos três já havia escrito um conto erótico, então, vejam vocês mesmos como cada um se saiu.

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