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quarta-feira, fevereiro 27, 2008

Encontro com o Mestre

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Atendendo a uma meia dúzia de três pedidos, vou contar um pouquinho sobre meu encontro com o mestre.

Ariano Suassuna, advogado, filósofo, professor universitário, romancista, poeta, teatrólogo e atual secretário de cultura de Pernambuco, esteve por aqui para uma palestra para professores da rede Municipal de Ensino, que encontram-se numa semana de planejamento pedagógico.

Um dos amigos mais antigos que tenho na cidade é filho de uma prima de Ariano e eu não sabia disso. Chaguinhas, o sobrinho, havia comprado um exemplar do meu livro e, com a vinda do primo, lembrou-se de mim. Me ligou e perguntou se eu gostaria de ter um encontro com o mestre. Ou seja, perguntou se o macaco queria banana.

Marcamos para as dezenove horas de ontem, uma hora antes de começar a palestra, no hotel onde ele se encontrava hospedado com a esposa e seu secretário particular.

Respondedo à pergunta da Esyath, não fiquei apreensivo, temeroso, intimidado ou qualquer coisa assim, fiquei ansioso e honrado. Ao chegar ao hotel o vi sentado numa poltrona, no foyeur, ladeado pela esposa e o secretário, um rapaz sisudo, contrastando com o bom humor de Ariano. Como me policio para não ser um chato e imaginando que uma verdadeira celebridade como Ariano deve ser procurado por chatos todo o tempo, evitei me aproximar. Saí à procura do Chaguinhas. Sou pontual, mas a média dos brasileiros, incluindo meu amigo, não o é. Mas ele não me fez esperar muito. Cinco minutos depois ele chegou.

Sem delongas, me levou à presença do primo a quem me apresentou como "o escritor de que lhe falei". Ariano ensaiou levantar-se para me cumprimentar, mas eu pedi que permanecesse sentado. Apertei-lhe a mão, cumprimentei os demais e aceitei seu convite para sentar-me na poltrona ao lado.

Sentei-me e o presenteei com meu livro com a seguinte dedicatória (por favor não riam): "Ao mestre Ariano, com as reverências desse modesto admirador. Espero que o senhor se divirta lendo, tanto quanto me diverti escrevendo. Com a sua bênção, Marcos Pontes. Eunápolis, 26 de fevereiro de 2008". Ele recebeu o presente, agradeceu, leu a dedicatória e, com sua voz rouca, acentuada pelo maravilhoso sotaque pernambucano, disse: "Deus o abençoe".

Perguntou-me do que tratava o livro. Respondi que eram contos sem uma temática central, boa parte deles centrada no Norte e Nordeste, alguns urbanos, outros rurais e outros com algum teor filosófico, mas sem influência direta de alguma escola. Não sou nenhum grande leitor de filosofia, por isso não poderia ter a ousadia de me posicionar em qualquer corrente filosófica, embora me considere meio euclidiano.

Mas eu não queria falar, preferia ouvir e o deixei à vontade para falar o que quisesse. Por dez minutos o ouvi falar da satisfação que tinha ao encontrar escritores nos mais distantes lugares do país. Havia acabado de chegar da Amazônia e tivera contato com diversas manifestações culturais, não só literárias, coisas que faziam aumentar seu amor pelas culturas populares do país; que estava terminando, por esses dias, um novo romance (idiotamente não perguntei qual o título ou a temática, mas logo, logo poderemos saber). Perguntou se eu era um mentiroso. Pego de surpresa, saí com uma daquelas respostazinhas bobas do tipo "às vezes sou". Pombas! Eu sei que ele adora mentirosos, mas, como ele mesmo diz, não os mentirosos maldosos, mas "aqueles que mentem por amor à arte". Querendo ser um escritor ficcional, é lógico que sou um mentiroso. Por conta da minha resposta boba, acho que recebi um pito. "A mentira do autor é pecaminosa, gostosa é a mentira dos personagens. Dizem que tenho uma grande critividade, bobagem. Eu apenas sei observar, os meus personagens são mentirosos de verdade que encontro por aí e me divertem, apenas passo para o papel as mentiras que ouço".

Estava na hora de começar a palestra. O prefeito chegou, interrompendo nossa conversa, cumprimentou Ariano, sua esposa e o secretário. Como somos amigos de longa data, desde o tempo em que ele era pobre, o prefeito não me tratou com o desdém comum às autoridades diante do cidadão comum e na presença de alguém importante. "Pelo visto o senhor já conheceu nosso mais novo escritor" (ele mesmo não leu meu livro). Falou para Ariano ao mesmo tempo em que apertava minha mão. Nos falamos rapidamente. Percebi que estava na hora de me retirar, já não era mais ambiente para mim.

Agradeci ao mestre pela atenção, disse-lhe da honra que era para a cidade tê-lo por aqui e me despedi. Nos encontraríamos na palestra.

Chaguinha pediu minha câmera, que eu, envergonhadamente, não havia colocado para trabalhar, evitando a postura de tiete, e tirou duas fotografias nossas. A foto acima tirei no final da palestra. Aliás, não foi uma palestra, mas uma aula divertidísima sobre a importância da valorização da cultura nacional. Mas isso é outro papo.

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