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sábado, fevereiro 23, 2008

Será verdade?

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O episódio que mais me encanta na recente história brasileira é a Guerrilha do Araguaia. Quando ocorreu o primeiro confronto entre o Exército e os guerrilheiros, eu era um garoto, morava em Maceió. Um primo, bem mais velho que eu, cabeludo e barbudo, que morava no Ceará, havia se mudado para Marabá, no Pará, bem perto de onde aconteciam os embates armados, em busca de emprego. Um tio nosso, irmão de nossas mães, era prefeito daquela cidade e o Joaquim, meu primo, esperava encontrar alguma colocação por lá.

Por conta de sua aparência (cabeludo e barbudo, o que era moda entre os jovens) e por não ser da região, Joaquim foi preso pelos militares e interrogado. Me lembro de ter ouvido essa história por alto, minha mãe conversava com alguém que não me lembro quem. Não me interessava por política, mas tinha algum encanto pela caserna, coisa natural num filho de militar. A notícia de que estava havendo um embate armado dentro do Brasil foi uma daquelas coisas emocionantes que habitam as fantasias infantis.

Meu pai lia muito jornal e já estava viciando-se em telejornais. Nessa época tivemos nossa primeira televisão. Ele sentava-se numa cadeira de espaguete, eu deitava no chão quadriculado de pedras pretas e brancas, e assistíamos juntos. Confesso que pouca coisa conseguia entender, mas algumas me chamavam a atenção. Pouco se falava no que acontecia em São Félix do Xingu, Redenção, Marabá, Bico do Papagaio, a não ser quando algum guerrilheiro era morto.

Pouco tempo depois meu pai foi transferido para Porto Velho e depois para Belém. Em Belém, durante a Reunião Anual da SBPC, conheci o Zé Valdir e mais três agricultores que estavam em Redenção na época dos conflitos. Já falei dele mais de uma vez por aqui. Durante essa mesma semana de Reunião Anual, que acontecia no Campus da Universidade Federal do Pará, comprei o primeiro livro sobre a guerrilha publicado no Brasil. Infelizmente não lembro o título ou o nome do autor. Já eram anos 80, a Abertura já mostrava seus sinais, eu era um adolescente. Por três dias convivi com o Zé Valdir e o incitava a contar episódios do conflito, como os guerilheiros chegaram na região, de que viviam, como conversavam com as pessoas, se andavam armados...

Não vem ao caso tudo o que me lembro, mas duas coisas interessam para esse caso: 1. Ele me contou que helicópteros faziam vôos rasantes sobre a cidade com corpos de guerrilheiros pendurados em cordas muito compridas. Os militares diziam ao povo local que era aquilo que acontecia com os traidores da pátria, que aquele ou aquela era um bandido, assassino, que queria entregar o Brasil para os comunistas e coisas que tais. Numa dessas vezes Zé Valdir conseguiu identificar o Osvaldão, um negro enorme de quem se tornara amigo. Lá estava Osvaldão morto, pendurado pelos pés, dando voltas sobre Redenção; 2. José Genoíno era odiado em Redenção e em toda a região dos conflitos, até mesmo por aqueles que não aceitavam os guerrilheiros, por esses ainda mais. Que Genoíno era um traidor, que delatara os companheiros, era o responsável pela morte dos 69 companheiros. Nem os militares, que não o torturaram, o respeitavam, tinham nojo dele.

Eis que agora leio essa reportagem da Isto É. Incrível como as informações do Coronel Curió, um sujeito por quem sempre tive os piores sentimentos, casam-se certinho com as do agricultor Zé Valdir.

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