"Me esquenta que o cobertor é curto"
(Chico Buarque)
(Chico Buarque)
Você entende os índices econômicos oficiais? Divago sobre isso no site do Pedro.
O Dia Que o Piauí Mudou o Brasil
Sem qualquer aviso prévio o presidente convocou os ministros da infraestrutura e das forças armadas. Ao primeiro ordenou que cercasse todo o Piauí com um muro de concreto com quatro metros de altura, cercas de arame farpado e elétrica de ambos os lados desse muro. Guaritas com condicionador de ar e banheiro a cada duzentos metros.
Ao ministro das forças armadas ordenou que fossem vigiadas todas as fronteiras terrestres, aéreas, marítimas e fluviais. Até que o muro ficasse pronto os soldados não deveriam fazer nada.
Com a movimentação de milhares de trabalhadores em volta do estado a imprensa se alvoroçou, o Congresso Nacional virou um formigueiro e o presidente nada dizia. Refugiou-se na Granja do Torto e realizava intermináveis reuniões com donos de hotéis de todo o país, comandantes das polícias estaduais, delegados da Polícia Federal, representantes das empresas de transporte de passageiros. Nada de notas para a imprensa, sigilo absoluto.
Concluído o muro, mais uma reunião com o ministro das forças armadas e chefes de polícia. Mandou que esvaziassem o Piauí. Só deveriam ficar no estado funcionários públicos corruptos, políticos corruptos, motoristas que dão "caixinha" para o guarda de trânsito para evitarem multas, os guardas que recebiam a propina, assassinos, traficantes de drogas, políticos envolvidos em falcatruas, estupradores, estelionatários, agiotas, enfim a ralé humana.
Assim foi feito. Muito pouca gente ficou naquelas terras. A grande massa de homens de bem foi retirada para todos os estados da federação. Aviões decolavam lotados de passageiros vinte e quatro horas por dia, quem tinha medo de voar era levado de barcos pelo Rio Parnaíba ou em ônibus leito. Os doentes eram transportados em UTIs móveis ou UTIs aéreas. Em seus destinos eram hospedados em hotéis, escolas, alojamentos dos estádios, casas de amigos, hospitais...
E o país já pensava em depor o presidente, sua saúde mental não estava em ordem. O país não podia ficar nas mãos de um lunático. Os partidários do presidente faziam de tudo para manterem-no no cargo, embora também não entendessem o que estava acontecendo. Debates em todos os meios de comunicação, Anistia Internacional, defensores dos direitos humanos, advogados, Supremo Tribunal Federal, sindicatos patronais e de trabalhadores, embaixadas de todo o mundo, ONU, enfim, o mundo todo com um olho em Teresina e outro em Brasília.
Evacuado o estado, mais uma reunião com os comandantes das armas e os chefes de polícia de todo o país. A ordem agora era repovoar o Piauí. Os bandidos de cada grotão do Brasil, da mesma cepa daqueles que ficaram nas terras piauienses, deveriam ser levados em caminhões pau-de-arara para lá e impedidos terminantemente de sair. Aviões não entravam e nem saiam. A partir daquele momento o Piauí era o único presídio desse país, superlotado, diga-se de passagem.
Quase todos os estados ficaram sem governador, cidades sem prefeitos, pouquíssimos deputados estaduais e vereadores ficaram em suas terras, o Congresso Nacional foi praticamente esvaziado. O corpo de polícias foi reduzido drasticamente em todos os lugares, órgãos públicos ficaram sem funcionários, motoristas irresponsáveis desapareceram. O país estava quase parado.
Estava na hora de colocar em prática a última parte do plano.
Os piauienses deportados ganharam as casas e empregos dos que foram enviados para o Grande Presídio. Os suplentes de parlamentares que se salvaram assumiram os cargos, em muitos lugares foram necessárias outras eleições, todas pagas com o dinheiro do bolso do candidato e a preços mínimos. Funcionários de rádios, jornais, televisões e sites assumiram as empresas na forma de cooperados, novos médicos e advogados assumiram as vagas deixadas por aqueles que foram levados para trás do grande muro.
Passadas as primeiras semanas, a poeira assentando, começaram a reaparecer as cadeiras nas calçadas nos fins de tarde, crianças voltaram a brincar nas ruas, o serviço público atendia as pessoas como cidadãos, os juros caíram, a inflação zerou, o PIB crescia assustadoramente, as mortes no trânsito e nos hospitais foram a patamares comparáveis aos da Suíça, o risco país veio a cinco pontos com tendência de baixa, as delegacias ficaram às moscas, celas vazias por dias e dias a ponto dos policiais prenderem bêbados com a justificativa de se manter a ordem nas ruas. Havia nascido um novo país.
O presidente convocou, então, uma entrevista coletiva.
- Senhor presidente, aquelas pessoas levadas para o Piauí não morrerão de fome e doenças?
- Por uma questão de humanidade a União fornecerá remédios e alimentos gratuitamente por um ano. Depois disso eles que produzam.
Ninguém reclamou. Com a economia voando em céu de brigadeiro e a renda per capita comparável à do Japão permitiam essas despesas.
- Senhor presidente, por que o senhor escolheu o Piauí?
- Por ser o estado mais pobre da Federação com pessoas maravilhosas que não merecem o destino que estava traçado para elas. Terras maltratadas têm agora uma utilidade para todos os brasileiros.
Ninguém reclamou. Houve até quem se emocionasse com ato tão nobre.
- Senhor, agora que o senhor cumpriu a maior missão que um governante poderia realizar, quais são seus planos futuros?
- Vou criar porcos no sítio que o governador me deu em Buriti dos Montes.
Todos aplaudiram.
Ao ministro das forças armadas ordenou que fossem vigiadas todas as fronteiras terrestres, aéreas, marítimas e fluviais. Até que o muro ficasse pronto os soldados não deveriam fazer nada.
Com a movimentação de milhares de trabalhadores em volta do estado a imprensa se alvoroçou, o Congresso Nacional virou um formigueiro e o presidente nada dizia. Refugiou-se na Granja do Torto e realizava intermináveis reuniões com donos de hotéis de todo o país, comandantes das polícias estaduais, delegados da Polícia Federal, representantes das empresas de transporte de passageiros. Nada de notas para a imprensa, sigilo absoluto.
Concluído o muro, mais uma reunião com o ministro das forças armadas e chefes de polícia. Mandou que esvaziassem o Piauí. Só deveriam ficar no estado funcionários públicos corruptos, políticos corruptos, motoristas que dão "caixinha" para o guarda de trânsito para evitarem multas, os guardas que recebiam a propina, assassinos, traficantes de drogas, políticos envolvidos em falcatruas, estupradores, estelionatários, agiotas, enfim a ralé humana.
Assim foi feito. Muito pouca gente ficou naquelas terras. A grande massa de homens de bem foi retirada para todos os estados da federação. Aviões decolavam lotados de passageiros vinte e quatro horas por dia, quem tinha medo de voar era levado de barcos pelo Rio Parnaíba ou em ônibus leito. Os doentes eram transportados em UTIs móveis ou UTIs aéreas. Em seus destinos eram hospedados em hotéis, escolas, alojamentos dos estádios, casas de amigos, hospitais...
E o país já pensava em depor o presidente, sua saúde mental não estava em ordem. O país não podia ficar nas mãos de um lunático. Os partidários do presidente faziam de tudo para manterem-no no cargo, embora também não entendessem o que estava acontecendo. Debates em todos os meios de comunicação, Anistia Internacional, defensores dos direitos humanos, advogados, Supremo Tribunal Federal, sindicatos patronais e de trabalhadores, embaixadas de todo o mundo, ONU, enfim, o mundo todo com um olho em Teresina e outro em Brasília.
Evacuado o estado, mais uma reunião com os comandantes das armas e os chefes de polícia de todo o país. A ordem agora era repovoar o Piauí. Os bandidos de cada grotão do Brasil, da mesma cepa daqueles que ficaram nas terras piauienses, deveriam ser levados em caminhões pau-de-arara para lá e impedidos terminantemente de sair. Aviões não entravam e nem saiam. A partir daquele momento o Piauí era o único presídio desse país, superlotado, diga-se de passagem.
Quase todos os estados ficaram sem governador, cidades sem prefeitos, pouquíssimos deputados estaduais e vereadores ficaram em suas terras, o Congresso Nacional foi praticamente esvaziado. O corpo de polícias foi reduzido drasticamente em todos os lugares, órgãos públicos ficaram sem funcionários, motoristas irresponsáveis desapareceram. O país estava quase parado.
Estava na hora de colocar em prática a última parte do plano.
Os piauienses deportados ganharam as casas e empregos dos que foram enviados para o Grande Presídio. Os suplentes de parlamentares que se salvaram assumiram os cargos, em muitos lugares foram necessárias outras eleições, todas pagas com o dinheiro do bolso do candidato e a preços mínimos. Funcionários de rádios, jornais, televisões e sites assumiram as empresas na forma de cooperados, novos médicos e advogados assumiram as vagas deixadas por aqueles que foram levados para trás do grande muro.
Passadas as primeiras semanas, a poeira assentando, começaram a reaparecer as cadeiras nas calçadas nos fins de tarde, crianças voltaram a brincar nas ruas, o serviço público atendia as pessoas como cidadãos, os juros caíram, a inflação zerou, o PIB crescia assustadoramente, as mortes no trânsito e nos hospitais foram a patamares comparáveis aos da Suíça, o risco país veio a cinco pontos com tendência de baixa, as delegacias ficaram às moscas, celas vazias por dias e dias a ponto dos policiais prenderem bêbados com a justificativa de se manter a ordem nas ruas. Havia nascido um novo país.
O presidente convocou, então, uma entrevista coletiva.
- Senhor presidente, aquelas pessoas levadas para o Piauí não morrerão de fome e doenças?
- Por uma questão de humanidade a União fornecerá remédios e alimentos gratuitamente por um ano. Depois disso eles que produzam.
Ninguém reclamou. Com a economia voando em céu de brigadeiro e a renda per capita comparável à do Japão permitiam essas despesas.
- Senhor presidente, por que o senhor escolheu o Piauí?
- Por ser o estado mais pobre da Federação com pessoas maravilhosas que não merecem o destino que estava traçado para elas. Terras maltratadas têm agora uma utilidade para todos os brasileiros.
Ninguém reclamou. Houve até quem se emocionasse com ato tão nobre.
- Senhor, agora que o senhor cumpriu a maior missão que um governante poderia realizar, quais são seus planos futuros?
- Vou criar porcos no sítio que o governador me deu em Buriti dos Montes.
Todos aplaudiram.
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