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sexta-feira, maio 18, 2007

Corte sem Corte




Paizinho engraçado, esse nosso... Hoje estou intimado a comparecer ao Tribunal de Júri às 9 horas na condição de componente do Corpo de Jurados. Suspendo tudo o que tinha que fazer, adianto as coisas no trabalho e me preparo para passar a sexta-feira de castigo, as probalidades me dizem que tenho 33,3% de chance de ser sorteado, caso não falte nenhum dos 21 intimados. A cada falta, minhas chances de ficar livre diminuem.

Pontual e responsável, chego às oito e cinqüenta. Logo percebo uma movimentação fora do comum, muitos homens desconhecidos com seus indefectíveis ternos pretos, como se fossem à uma reunião de maçons, diversos carrões entrando e saindo, todos com motorista e um segurança e com placas pretas do Tribunal de Justiça da Bahia. Ninguém nos dá qualquer explicação e o tempo passa. Chega a viatura da Polícia Militar que normalmente traz os réus, estaciona no local de sempre, não descarrega ninguém e parte dez minutos depois. Já são 9:40 h.

Mais dez minutos e os meirinhos nos chamam para a sala de júri. Lá no tablado estão o promotor, o juiz titular da Vara Crime, o juiz da Vara Cível e o Juiz do Juizado Especial e mais um senhor que não conhecemos. O juiz da Vara Crime, presidente do Tribunal, nos saúda e nos apresenta o senhor desconhecido, é o Desembargador Presidente da Corregedoria Geral de Justiça do Estado da Bahia em visita a Eunápolis a quem o juiz convida a dirigir algumas palavras aos "diletos representantes da sociedade eunapolitana", nós, os intimados, já de saco cheio pelo atraso.

O desembargador, breve em seu discurso, nos dá uma boa notícia. A cidade ganhará mais dois juízes e mais serventuários, o que agilizará os processos em andamento, que se acumulam nas prateleiras. O juiz retoma a palavra, pede desculpas pelo atraso e coloca a culpa na Polícia Militar, que está trazendo o réu de Itabuna, a 180 km daqui. Nós, os intimados, nos olhamos com cara feia e ficamos nos perguntando "por que não o fizeram ontem?". E o juiz continua, podemos ficar à vontade no "recreio", como ele mesmo diz, que logo seremos chamados novamente para, dessa vez, dar início à sessão. 10:00 h.

Nada alegres, voltamos para os corredores, para o bebedouro, rodinhas de conversas nada animadas. Mais dez minutos, nos chamam. O juiz, mais uma vez culpando o Executivo, pede desculpas. O carro que estava trazendo o preso havia ficado sem combustível no meio da viagem e a sessão ficava adiada para as treze horas. Tentando fazer gracinha, ainda nos diz "vejam pelo lado bom, hoje vocês poderão almoçar com suas famílias". Esqueceu-se de dizer que os sete sorteados jantarão no Tribunal. Em média, os julgamentos acabam entre 22 e 23 horas, ou seja, 13 horas de trabalhos ininterruptos. Ou melhor, com uma interupção de meia hora para o almoço. Começando às 13 e mandendo a média de duração, terminará entre 2 e 3 da madrugada de sábado.

Voltando ao carro, acho que é uma desculpa arrumada de última hora. Ninguém me tira da cabeça, que o tal carro é aquele que chegou pontualmente às nove horas, não descarregou ninguém e saiu do jeito que entrou. Ou seja, o carro ainda vai a Itabuna pegar o preso, e voltar. Duas horas e meia para ir mais duas horas e meia para voltar e mais o tempo perdido com as burocracias de praxe lá em Itabuna, sem falar que os policiais devem almoçar, esse sessão não começará às treze horas nem por milagre de Frei Galvão!

Mas, como não sou um cidadão, apenas um sujeito intimado que só tem o direito de obedecer, se não o fizer fica sujeito às sanções legais e a multa, estarei lá de volta às treze, junto com os outros 20 intimados, com nossas caras de palhaços sem pintura, esperando a boa vontade das autoridades. Minha sexta-feira foi pro saco e meu bom humor foi com ela.



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Atualização (que esse papo de up-date é pra gente chic que fala francês): Como eu previra, o preso só chegou às 14:05 h. A advogada assistente da defesa me conhece e sabe que não transijo com bandido. Fui o primeiro jurado a ser sorteado (de novo! No julgamento passado também o fui) e imediatamente recusado pela defesa. Devo uma cerveja à doutora Wilma.

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