O ENEM, Exame Nacional do Ensino Médio, instituído no governo de Fernando Henrique Cardoso, talvez seja uma boa alternativa no lugar das cotas. Uma única prova não comprova o aprendizado de um aluno, por isso o vestibular pode ser falho. Só a prova no ENEM também não pode ser referência para o aprendizado do aluno, mas os dois juntos diminuem sensivelmente o fator sorte para aqueles que aspiram por um lugar nas universidades públicas.
Embora seja um exame de caráter individual, indiretamente avalia também as instituições de ensino. Se a média dos alunos de um determinado colégio se sai bem nas provas, significa que a instituição está trabalhando direitinho; o inverso também é verdadeiro. Em nome de sua escola, as direções zelarão pela qualidade dos seus professores, afinal de contas, estarão sendo examinados no final do ano letivo através dos exames dos alunos. Entre as escolas particulares a concorrência é feroz, ninguém relaxa. A alta rotatividade dos docentes é uma comprovação. Professores cujos alunos não tiveram bom rendimento são substituídos.
O INEP, Instituto Nacional de Pesquisas Anísio Teixeira, é o órgão contratado para elaborar as provas, sua aplicação, correção e divulgação dos resultados. Além do ENEM, elabora e aplica outros exames, como o ENCCEJA, para jovens e adultos; o SAEB, para a eduxcação básica; e o ENADE, para o ensino superior. Sendo uma autarquia federal, ligada diretamente ao MEC, não pode ser considerada uma instituição isenta das influências político-partidarias. Tudo o que envolve governos desperta interesse de lobbies e esses exames não fogem à regra.
Tendo entre seus ministros Walfrido Mares Guia, primeiro como ministro do turismo e agora ministro das relações institucionais, o governo federal ficou sujeito a influências desse senhor no campo da educação.
Mares Guia, um irmão e mais três amigos fundaram o curso pré-vestibular Pitágoras que, com o decorrer dos anos, tornou-se uma das maiores instituições privadas de ensino brasileiras. Além dos colégios próprios, a Rede Pitágoras fornece franquia a centenas de escolas em todo o país, para que essas utilizem o material didático da Rede e, em menor número, instituições municipais. Alguns municípios Brasil a dentro também utilizam-se de suas apostilas.
Muitas dessas escolas "parceiras" estão em pequenas cidades, onde o número de escolas particulares, concorrentes diretas do Pitágoras nas localidades, é pequeno. Portanto, a busca por alunos é ferrenha. Poucos são os pais que podem bancar uma escola particlar para seus filhos em cidades pobres, daí um único aluno ser disputado a unhas.
Tem-se notado, nos últimos dois anos, que os resultados do ENEM divulgados pelo site do INEP tem contado com os resultados das escolas da Rede, enquanto que os resultados dos alunos das escolas concorrentes não aparecem. Ao lado da instituição aparece a sigla SC, Sem Conceito. O que chama a atenção é que o mesmo não ocorre nos grandes centros. Talvez por serem os donos de grandes escolas ou de franquias como Expoente, Objetivo, COC, Maristas, Nacional, Darwin e mais algumas, também são influentes, têm amigos e lobistas em Brasília, e logo a manipulação dos resultados seria contestada, podendo aparecer nos grandes jornais. Já no interior a coisa é mais tranqüila. Os donos são pequenos empresários locais, as escolas, em boa parte, não têm professores de gabarito, não se preocupam com vestibulares em universidades de renome. Manipular a divulgação dos resultados seria tranqüila, sem grande repercussão ou talvez nem fosse notada. Mas isso também tem seu limite.
Os donos das pequenas escolas engoliram os resultados de 2005. Inexperientes, aceitaram as explicações dadas pelo pessoal do MEC, os alunos não teriam identificado a instituição nos gabaritos. Mas em 2006 a coisa já não entrou tão fácil. As reclamações estão acontecendo e os prepostos do MEC partiram para a arrogância. Ora culpam os estudantes, ora as escolas e agora culpam o INEP. A coordenadora pedagógica de uma das escolas reclamantes ouviu do mal educado funcionário do MEC que os códigos da escola não foram colocados pelos alunos. Dessa escola, 58 alunos prestaram o exame em 2006, e nenhum colocou o código? Improvável. A coordenadora perguntou, mesmo sabendo a resposta, se o código da escola não era aquele impresso nas etiquetas auto-colantes com o nome do aluno. O funcionário disse que sim. Ela, então, foi certeira: quem havia afixado todas as etiquetas teria sido ela mesma, havia conferido uma por uma, não havia qualquer erro.
Sem saída, o funcionário transferiu a culpa para o INEP, que, em seu site, apressou-se a justificar:
"Os problemas detectados tiveram como causa a dificuldade de leitura dos códigos de algumas escolas e municípios e problemas no processamento técnico das respostas dos alunos, especialmente no escaneamento e interpretação eletrônica dos dados."
Se as etiquetas de todos os alunos de uma escola não são lidos, suas respostas não podem ser identificadas e seus dados não podem ser interpretados eletronicamente, ficam as questões:
- O sistema do INEP é confiável?
- Essas escolas foram cadastradas nos computadores do INEP?
- Após o primeiro ano, sendo identificados os problemas, não deveriam ter sido corrigidos e as escolas avisadas?
- Como os alunos prejudicados poderão ter os danos causados reparados, uma vez que puderam ter os pontos a que teriam direito não computados nos vestibulares que tomam as notas do ENEM como um dos critérios de aprovação?
- A quem interessa manter as coisas como estão?
Mais perguntas podem ser feitas e ao MEC e ao INEP cabem as respostas satisfatórias para escolas, alunos, pais e a sociedade como um todo.
Independentemente das justificativas dadas, a probidade do ENEM e, por tabela, das demais avaliações realizadas pelo MEC e pelo INEP perdem a confiança.
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