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domingo, junho 10, 2007




Num acesso de nostalgia, abri o Google Earth e resolvi passear pela minha vida.

A lembrança mais antiga que tenho é dos meus três anos de idade, na Rua D. Pedro II, brincando na calçada da vila onde morávamos. Meu irmão mais velho chegando de férias com o uniforme de passeio do Colégio Militar, onde era interno. Muito provavelmente nas férias de dezembro. Essa imagem se confunde com o carrinho de bombeiro vermelho, com escada Magirus e tudo o mais, que ganhei. Meu primeiro presente de Natal.

Na foto aérea vejo aquela casa, onde vivi até os sete. O gramado que ficava em frente e que nas minhas memórias era enorme, grande como um campo de futebol, não existe mais. Mas existem dezenas de árvores nos quintais de todas as casas da vila. Provavelmente a goiabeira de goiabas vermelhas, docinhas, e a mangueira na outra casa, no mesmo quarteirão, para onde nos mudamos depois de a família ganhar mais três membros e a moradia antiga ficar pequena.

A escolinha Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, onde fui alfabetizado, não existe mais e o Grupo Escolar Simon Bolívar não parece mais o mesmo. Tem telhados brilhantes, uma contrução coberta com telhas prateadas que parece ser um ginásio, no lugar da quadra descoberta.

Mas a pracinha ainda é a mesma, a igrejinha em que fui batizado junto com meus irmão, todos de uma vez, as ruas por onde corria a cada vez que minha mãe me mandava à bodega do Seu Rossini comprar alguma coisa, a Catedral agora com uma praça arborizada onde antes era um descampado... Tudo ali, menos a escolinha e o aeroporto, agora uma enorme praça com árvores colocadas a distâncias regulares. Ainda haverá o pequeno zoológico onde um macaco aranha roubou minha chinela e saltou para o alto da árvore me deixando aos gritos lá em baixo e o jacaré que mordeu o pé do meu desavisado irmão que aproximou-se demais à procura do bicho?

Atravessei o país rumo ao leste. Comecei pelas três casas onde morei ali. Minha escola que agora tem outro nome, a casa da Soraya, minha primeira paixão (não correspondida, pobre eu), a quadra do quartel onde eu e o Cícero criamos o Vila Velha Futebol Clube, um grupelho de sete garotos que convidavam adversários para joguinhos jogados na garra como um final de campeonato, que tinha em mim o único ponta direita de que já ouvi falar em futsal, e um goleador razoável. Naquelas casas não estão mais os alpendres que o velho Chico construia em cada casa onde morávamos.

Naquela praia quase morri afogado, salvo por um desconhecido a quem não sei se meu irmão mais velho, que me acompanhava naquele dia, agradeceu. Eu não agradeci, mas não esqueço dele e do quanto terei uma gratidão eterna.

Noutro vôo para leste, momentos nada felizes. O colégio interno que me traz pesadelos até hoje. A barra era pesada. Para espairecer, o Bar e Lanchonete Letícia onde conheci a vaca-preta e o milk-shake, o Teatro, onde subornávamos o porteiro para assistir a alguma coisa mais interessante ou simplesmente para ter algum alívio para a alma e onde tive o prazer de me apresentar no coral. Meu primeiro gostinho pela arte e o prazer do palco. A casa da Mirza, a segunda paixão, dessa vez correspondida, mas atemorizante. Ela me pegava de um jeito que assustava o moleque sem malícia, que jamais havia trocado um beijo. Com medo, fugi dela, que terminou arrumando um namoradinho meu homônimo, engravidou e terminamos perdendo o contato por alguns anos.

Outra cidade, outras moradias, outras escolas depois, não lembro como, descobri seu telefone e criei coragem de ligar. Agora com dezoito anos e uma saudade teimosa. Sua beleza morena de índia, linda, linda, povoavam meu sonho. Tão nova, já mãe, casara-se com meu xará, mas já encontrava-se separada. Nos falamos mais algumas vezes até que nos distanciamos definitivamente. Dela apenas uma memória boa e a lembrança do sorriso lindo embaixo daueles cabelinhos negros e curtos.

Na nova cidade, os amigos que marcaram para sempre, o amadurecimento, várias casas, tantas que devo ter esquecido de visitar alguma, os teatros em que me apresentei, não mais como cantor, mas como ator amador (nossa! Quanta rima!). A casa daquela que não seria só mais uma paixão, mas o primeiro, doloroso e inesquecível amor. Os bares, a grande praça de tantos fins de tarde, o rio, os barcos... Ali me tornei adulto e trabalhador. Experiências para todo o sempre e o guru definitivo. O homem que me ensinou a entender como eu via a vida e que vida eu gostaria de levar. Uma cidade perdida no meu passado, muitos anos sem rever, mas uma saudade que não cessa.

Mais cidades, muitas outras. As em que morei ou apenas passeei. Todas as árvores que plantei, muitas outras casas, muitas outras gentes, muitos gostos, alguns desgostos, outras paixões, outra família... Uma vida inteira na viagem rápida internética. Três horas da manhã e eu aqui olhando o teto da casa atual. Até quando?

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